A enorme “boca de jacaré” entre juros e desemprego
A taxa Selic, em 15,00% a.a., está no nível mais alto desde 2006. Ao mesmo tempo, a taxa de desemprego no Brasil vem oscilando em torno do nível mais baixo da série histórica (iniciada em 2012) – na última leitura, atingiu 6,6% no trimestre terminado em abril, ou 6,2% de acordo com o nosso ajuste sazonal.
Como pode um desemprego tão baixo conviver com um juros tão altos? A resposta é bem clara: excesso de estímulos na economia brasileira. Aliás, o gráfico abaixo mostra que a “boca de jacaré” atual entre taxa de desemprego e de juros só se compara à do período Dilma, momento em que o governo também promoveu fortes estímulos na economia.
Que tipo de estímulo?
Nos anos recentes houve crescimento significativo dos gastos do governo, com tais recursos sendo utilizados para financiar medidas que estimulam a economia, como o aumento do salário-mínimo acima da inflação, a antecipação de precatórios, o crescimento do número de beneficiários em programas sociais, dentre outros.
Tais medidas impulsionam a demanda agregada, com um claro viés para o consumo. Não é surpresa, portanto, que a média do crescimento do consumo das famílias em 2023 e 2024, em 4,0%, foi bem acima da média do crescimento do investimento em capital fixo e do PIB no mesmo período (2,2% e 3,3% respectivamente).
Esses números mostram um fato importante: estimular o consumo com gasto público é bem mais fácil do que fomentar o investimento. Se as famílias experimentam um aumento de recursos no bolso, o consumo cresce. Por sua vez, o investimento privado só é impulsionado quando o custo do capital (isto é, a taxa de juros) torna viável novos projetos e quando o ambiente de negócios tem o mínimo de previsibilidade.
O atual nível da taxa Selic, fundamental para o controle da inflação, certamente inviabiliza muitos projetos de investimento. Isso, juntamente com incertezas elevadas, inclusive tributárias – vide o recente imbróglio sobre o IOF e outras medidas visando aumento de receita –, tornam turvo o horizonte de investimentos, dificultando assim a realização de projetos que seriam fundamentais para aumentar nosso PIB potencial.
O resultado é um crescimento baseado em muito consumo e com pouco investimento. Essa discrepância entre consumo e investimento, se duradoura, é preocupante, já que se torna insustentável após alguns anos.
O que a performance recente da indústria brasileira nos mostra?
O investimento em capital fixo é uma métrica que pode ser bastante ilusória. Afinal, fracassos ocorrem e nem todo investimento gera resultados positivos. Isso ficou bastante evidente no período do governo Dilma, em que houve forte redução do investimento, cujo nível até os dias de hoje não superou o auge da época, e nem tampouco voltou a superar o consumo das famílias (vide gráfico).
Uma alternativa é olhar para a dinâmica da indústria, setor que requer investimentos relevantes e cuja performance captura de certa forma o investimento efetivo, descontados os fracassos.
O gráfico abaixo mostra que a indústria brasileira parece ter “perdido o bonde da história” desde o início de 2011. De fato, a “boca de jacaré” entre a indústria brasileira e a indústria mundial começou a ser criada nesta época e piorou no final de 2014 (quando houve forte queda do investimento também).
Esta é uma evidência de que o modelo de crescimento brasileiro tem sido muito mais baseado em consumo do que em investimentos produtivos.
Três “bocas de jacaré” e como nos livrar delas
As discrepâncias – ou “bocas de jacaré” – entre juros e desemprego, consumo e investimento, e indústria mundial e indústria brasileira indicam que é preciso repensar o modelo de crescimento brasileiro.
O crescimento do tamanho do governo tem exercido pressão sobre a demanda e levado a uma taxa de juros muito elevada. Isso tem gerado um desbalanceamento entre consumo e investimento, que impede que nosso crescimento potencial aumente.
Como sair dessa? A resposta é bem evidente: reduzir o tamanho (gasto) do governo. Isso diminuiria pressões sobre a demanda agregada, permitindo um equilíbrio com juros menores e com mais investimento.
No entanto, a discussão em curso em Brasília, focada no IOF e medidas arrecadatórias para substituí-lo ou atenuá-lo, e com medidas módicas de redução de gastos, não aponta nessa direção.
Como as consequências dessas decisões tendem a ser mais relevantes no longo prazo do que no curto prazo, as chances de mudanças nesta abordagem no curto prazo parecem muito baixas.
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